Imaginação e Leitura, possibilidades de diálogo para a construção de algo novo.

Rene Magritte The Therapist
Rene Magrite – O terapeuta

O que podemos compreender como imaginação? Como ela se opera, aonde acontece e para o que serve? Imaginar é a mesma coisa que sonhar? O imaginário correspondente ao que chamamos de devaneio ou alienação? Existe uma intencionalidade do sujeito para imaginar? Imaginar é uma criação potencializada pela leitura? Qual seria a função de imaginar um mundo para os diálogos com a realidade?

Percebe como essas perguntas são conduzidas por investigações da linguagem? Jean-Paul Satre já teria dito a esse respeito que “a imaginação se apoia em palavras”.

Ao longo da história, a imaginação já foi considerada desnecessária para a razão, assim como foi tomada como o cerne para potência dessa capacidade de usar a razão, de pensar. A imaginação já foi delírio e classificada como inútil ou amoral. Não foi na República de Platão que lemos que a cidade deveria abrir as portas para que os poetas passassem, entrassem e saíssem sem participar do debate político uma vez que deles a imaginação trairia com mentiras, uma distorção do real, a inversão de quem toma o reflexo ou a sombra como a própria vida, como também brilhantemente nos fez saber no mito da caverna?

Ao recordar Zaratustra, a voz profética da narrativa de Nietzsche, o mesmo destino espera os poetas. Mas, Zaratustra se assume, também, poeta, e eis o paradoxo em perfeita harmonia com o prefácio que abre a obra, o que seria o grande sermão, o texto das três transformações do espírito, aonde se revela como ápice, para a metamorfose, evolução, a criança, ” a inocência, e o esquecimento, um novo começar, um brinquedo, uma roda que gira sobre si, um movimento, uma santa afirmação. Sim; para o jogo da criação, meus irmãos, é preciso uma santa afirmação: o espírito quer agora a sua vontade, o que perdeu o mundo quer alcançar o seu mundo”.

Então, como se poderia definir a imaginação, considerando essa vontade de vislumbrar mundos e criar realidades a partir dessas ideias em contraponto com as investigações racionais e concretas e científicas?

Retornar à leitura pode ser um caminho. Mas, antes, o que poderemos compreender como leitura se a capacidade humana de ler é muito mais ampla do que a conjectura explícita de um leitor supostamente mergulhado na narrativa de um livro que repousa em suas mãos?

Eu não tenho uma resposta útil para nenhuma dessas questões, mas reconheço por minha própria experiência leitora, que a leitura se amplifica a medida que o leitor passa a olhar o mundo com os olhos de quem o lê lendo a si mesmo, e isso, é, sem dúvida, desenvolvido com fluidez quando esse leitor se permite – e a ele seja permitido – estar à vontade com seus pensamentos, imaginar seus próprios mundos.

A leitura não encerra a imaginação, felizmente. Digo isso porque há quem se preocupe demais com o que leem os outros leitores. Há sempre uma janela na imaginação de quem lê. A janela da dúvida. A possibilidade de fazer da pergunta uma conversa. Conheci leitores que ostentavam bibliotecas de milhares de volumes, clássicos, grandes nomes, reconhecida notoriedade, e a afirmativa contundente de todos terem sido lidos. Nem por isso eu vi da imaginação dessas pessoas leitoras brotarem os melhores mundos, os mais dialógicos, discursos impregnados pelo otimismo da alteridade. O intelecto ascende ao se engrandecer no afeto. Ao contrário, há tanta leitura de sabedoria em gente que nunca leu uma página se quer.

Talvez o que temos de melhor nesse caso é a manutenção da dúvida, assim como o profeta, o leitor rejeita a não-afirmação sem abandonar uma pergunta que incida sobre ela. A imaginação e a leitura se relacionam nesse campo, onde a censura, mesmo engenhosa, nunca conseguiu penetrar por completo.

Um comentário em “Imaginação e Leitura, possibilidades de diálogo para a construção de algo novo.

  1. A imaginação é o que nos diferencia dos animais. No Sapiens de Yuval Harari há um capítulo que chama-se A Revolução Cognitiva onde ele fala justamente sobre a imaginação e sobre como esta foi a grande virada que levou ao desenvolvimento de tudo. Imaginar o que não existe é a nossa capacidade de sonhar, criar e desejar e assim, ir atrás para conseguir.

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